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Histórias alegres, histórias tristes
Cria de alma-negra junto à marca do seu ninho, neste caso o ninho B18. |
Como já foi antes referido, os ninhos de alma-negra em
estudo eram visitados diariamente. Numa primeira fase, o objectivo
era saber se os ovos chegavam ao seu termo e conhecer a data da
eclosão em cada ninho. Nascidas as crias, apenas uma em cada ninho
como é normal nas aves marinhas, o trabalho tornava-se mais intenso.
A cada dia os ninhos eram visitados, continuando a verificar se os
ovos mais retardatários já tinham eclodido, anotando os ninhos em
que a incubação tinha falhado, e nos ninhos com crias havia que
pesar as crias. Todas as crias eram pesadas diariamente para conhecer
os padrões de variação do peso, através dos quais é possível
reconhecer os padrões de vinda ao ninho dos adultos e ter uma noção
da quantidade ou qualidade do alimento trazido.
Algumas crias pouco variavam de peso de um dia para o
seguinte, tendo provavelmente recebido uma refeição parca na noite
anterior. Outras, coitadas, diminuíam de peso, sinal de que não
tinham sido alimentadas e situação que, caso se repita vários dias
seguidos, pode resultar na morte das crias. Felizmente, o mais
habitual era detectar um saudável aumento do peso que em alguns
casos podia ser de mais de 10 g num só dia, o que em pequenas
criaturas que pesam à nascença entre 15 e 20 g é obra! Claro que
depressa se desenhou nas nossas mentes um pequeno campeonato da
engorda, em cada dia queríamos saber quem era a cria mais pesada da
colónia, o verdadeiro peso-pesado.
Claro que, como já insinuei em cima e está patente no
título, nem tudo corre sobre rodas para as almas-negras. Até ao dia
em que escrevi estas linhas nenhuma cria tinha morrido por falta de
alimento, mas tivemos já duas baixas por predação. Num caso,
particularmente tétrico, encontramos a cria ainda meia-viva, a ser
comida viva por lagartixas sem que o adulto, que se encontrava no
ninho, fizesse alguma coisa para o evitar. Dizem-me os meus colegas
que estas situações acontecem apenas no primeiro dia de vida das
crias, ou porque os fluídos do ovo recém-eclodido atraem as
lagartixas, ou porque o recém-nascido ainda molhado do nascimento
não tem a pele suficientemente dura, ou a penugem suficientemente
farta, para evitar o ataque das lagartixas. Pode também ter que ver
com a ausência dos adultos, que é incomum logo após o nascimento,
ou como neste caso a incapacidade de alguns adultos menos experientes
para defender a cria das lagartixas. No caso das cagarras, sabe-se
que cerca de 5% das crias que nascem têm este fim algo trágico, mas
a verdade é que as lagartixas são omnipresente por toda a ilha, e
em números absurdos, pelo que acaba por ser surpreendente estes
acidentes de percurso não acontecerem mais vezes. A outra vítima
de predação foi deixada sozinha no ninho logo no dia do seu
nascimento, o que geralmente não augura nada de bom, tendo nós
encontrado o ninho vazio no dia seguinte. Neste caso suspeitamos das
gaivotas, que se sabe comerem almas-negras, tanto crias como adultos,
e são os suspeitos do costume nestes casos.
Amanhã voltaremos à carga, para pesar mais crias e dar
as boas-vindas às próximas a nascer, sendo que dos 88 ninhos em
estudo já nasceram por agora mais de metade.
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