terça-feira, setembro 11, 2012

Postais das Selvagens


18 – Encontros no fundo do mar

Cardume de barracudas a nadar eternos círculos na Baía das Cagarras.

Já falei antes das muitas tardes passadas a nadar com os inúmeros peixes que abundam na Enseada das Cagarras. Na verdade, tornou-se uma actividade diária, ao final da manhã depois de voltar do planalto, ou ao fim da tarde antes do jantar. Ao fim de alguns dias, algumas espécies, devido à sua abundância e frequência, tornaram-se parte da paisagem. Não quer isto dizer que deixei de gostar de os ver e de nadar junto a eles, mas comecei a coleccionar momentos mais especiais, observações mais raras, delícias para os olhos gulosos de cor e movimento.
Ao longo destas semanas de mergulhos diários na Baía das Cagarras, o meu peixe favorito é sem dúvida o peixe-cão. São peixes grandes, com mais de meio metro de comprimento e cores garridas, base vermelha com laivos amarelos e esverdeados. Geralmente surgem sempre de forma inesperada, a nadar calmamente junto ao fundo. Uma vez estava a nadar junto a umas rochas, numa zona pouco profunda e um peixe-cão não teve alternativa senão passar a meio metro de mim, foi extraordinário.
Depois haviam as espécies menos comuns. Um dia mergulhei até ao fundo para ver um peixe-cão e saiu de entre as rochas um vaso, um peixe relativamente grande, às manchas vermelhas e prateadas e com uns olhos enormes. Outra vez atravessa a zona de água mais profundas para chegar de uma rocha para outra e saiu-me ao caminho um charoteiro, um peixe grande e prateado que nadava a grande velocidade, indiferente à minha presença. As moreias passam o tempo escondidas nas suas tocas, só raramente se deixam ver. No dia em que os pescadores nos deram o gaiado, os restos da amanha dos gaiados geraram um grande frenesim entre os peixes. Enquanto nadava entre as pedras vi finalmente uma moreia, a espécie castanha-escura conhecida como moreão, a sair da toca para abocanhar um pedaço de gaiado e fugir com ele para o seu buraco escuro. Os afonsinhos são pequenos peixes de cor alaranjada, que até agora só vi uma única vez. Estavam junto ao fundo e encontrei-os enquanto seguia um peixe-cão. Surgiram por entre umas pedras e logo desapareceram e por mais que gastasse o meu fôlego a mergulhar à sua procura não os voltei a ver.
Outro grande atractivo eram os cardumes. Uma vez dei por mim entre um cardume de cerca de duzentos facaios, que nadam em meu redor exibindo as suas barbatanas bicolores, outras vezes encontrava cardumes de pequenas salemas, sempre inquietas a nadar rapidamente num sem fim de riscas amarelas em corpos prateados. Nas zonas mais protegidas da baía é habitual encontrar cardumes de barracudas, que nadam geralmente a meia água, permitindo que nós possamos boiar sobre elas enquanto nadam em eternos círculos ou espirais. Deve se assim que se sentem os pássaros a olhar de cima para nós. Finalmente, lembro-me de uma tarde em que nadava numa zona com muitas castanhetas e algo na limpidez da água e no ângulo com que os raios do sol entravam na água fez com que estes peixes, geralmente castanhos com alguns laivos de azul profundo, parecessem completamente liláses, como flores a nadar entre as rochas da baía.
Estar nesta ilha, poder ver estas maravilhas aquáticas e ter perfeita noção da sorte que tenho por ter acesso a este local é de facto algo de único.

Sem comentários: