quarta-feira, setembro 12, 2012

Postais das Selvagens


19 – Pios pela manhã

Cria de alma-negra com poucos dias de vida.

Como tinha já falado antes, uma das nossas principais tarefas na ilha era o seguimentos dos ninhos de alma-negra, com vista a conhecer melhor a biologia reprodutiva da espécie. Inicialmente visitávamos os ninhos para confirmar se a ave estava a incubar o ovo e mais tarde deveríamos pesar e medir diariamente as crias para avaliar o seu desenvolvimento. Claro que entre estas duas fases fica o momento mágico da eclosão, o nascimento de uma nova ave.
Nos primeiros dias a questão era saber se os ninhos continuavam activos ou se se perdiam por algum motivo, sendo que havia sempre algum desapontamento quando encontrávamos um ninho vazio ou um ovo abandonado, apesar de ser natural que nem todos os ovos cheguem ao seu termo, quer por motivos externos como internos. Depois de cerca de uma semana nesta rotina, começaram a surgir os primeiros sinais de que os nascimentos estavam para breve. Num dia notamos as primeiras rachas num ovo, no dia seguinte começamos a ouvir alguns ovos a piar, um fenómenos curiosíssimo que se observa em diversas aves, quando as crias ainda no ovo começam já a piar e o seu som é claramente audível no exterior. Subitamente o ovo deixa de parecer um objecto inerte para nos relembrar que é o berço de uma nova vida.
No dia seguinte as almas-negras começaram a eclodir. Isso não acontece em todos os ninhos em simultâneo, muito pelo contrário. No primeiro dia nasceram quatro, nos dias seguintes mais e mais novas aves, todas elas incrivelmente cómicas e fofinhas na mais perfeita acessão deste adjectivo. Imaginem uma daquelas bolas para libertar o stress, eriçadas com imensos bicos moles de borracha que massajam a nossa mão ao serem apertados. Agora substituam os bicos de borracha por plumas suaves de cor escura e acrescentem num dos lados um pequenito bico preto. Têm uma cria de alma-negra, só convém é não as apertar como as bolas de libertar o stress!
Nos primeiros dias as pequenas bolas de plumas são aquecidas pelo pais, que lhes garantem o calor e a protecção necessários, mas rapidamente a sua fome voraz obriga ambos os pais a passarem muito tempo no mar a pescar e as crias começam a ficar sozinhas em casa, é então que as começamos a pesar, e a medir as suas diminutas asas ainda desprovidas de penas.

Sem comentários: