3 - Selvagens à
vista
Vislumbra-se o leve vulto da Selvagem Pequena no horizonte, sob o olhar atento de um dos marinheiros do N.R.P. Cuanza |
Por
volta das dez horas avistamos a Selvagem Pequena, nosso primeiro
destino do dia. Por entre a neblina que demorava a levantar,
avistamos um triângulo de lados desiguais, o pequeno pico que domina
a ilha, que mais tarde me disseram chamar-se Pico do Veado. A
silhueta da ilha foi crescendo no horizonte, como se se erguesse
lentamente das águas, e eventualmente começamos também a ver o
resto da ilha, composta por praias arenosas e muitas rochas, assim
como os muitos ilhéus que circundam a ilha. Notava também na
vertente da ilha um tom esverdeado da pouca vegetação que por lá
cresce.
Assim
que nos aproximámos, surgiram em redor do barco andorinhas-do-mar a
dar-nos as boas vindas com os seus chilreios, assim como algumas
gaivotas que nos sobrevoaram com o ar enfadado de quem se apercebe
que este barco não era um pesqueiro e não oferecia nem peixe nem
outra fonte de alimento. Surgiu também o bote dos vigilantes que
depois de três semanas sozinhos, quais Robinson Cruzués
voluntários, deviam estar ansiosos por voltar a ver outros entes da
sua espécie. Com uma eficácia extraordinária, trouxeram para bordo
o seu equipamento e uma quantidade tristemente impressionate de sacos
cheios de lixo que tinham recolhido durante a estadia na ilha. O
lixo, claro, não era dali, era oriundo de terras civilizadas
distantes, na sua maioria plásticos numa profusão de garrafas,
embalagens e caricas que nos lembram o impacto que a humanidade tem
sobre este planeta, que se faz sentir até mesmo nestes lugares
remotos e aparentemente selvagens e pristinos.
Acabado
o embarque de pessoas e material na Selvagem Pequena, e avistado ali
tão perto o tal Ilhéu de Fora que marca o limite sul de Portugal, o
barco zarpou com destino à Selvagem Grande, o meu destino. A viagem
que normalmente demoraria pouca mais de uma trintena de minutos,
acabou por durar bem mais, fruto das obrigações de patrulhamento que naturalmente se exigem de um patrulha. Em vez de virar logo para
nordeste, o barco teve de seguir para sul para controlar um barco que
se aproximava indevidamente de águas portuguesas. Felizmente não
houve necessidade de batalha naval. Ou por nos ter avistado, ou
porque realmente não pretendia invadir as nossas águas, o barco
virou para outras águas e libertou a marinha das suas funções
mais bélicas.
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