terça-feira, agosto 14, 2012

Postais das Selvagens


2 - Partida do Funchal

A bordo do patrulha N.R.P. Cuanza, com o Funchal ao fundo

Para chegar às selvagens tive de recorrer à ajuda da marinha, que tem a responsabilidade de patrulhar aquelas águas contra a ocasional introsão de algum barco de pesca estrangeiro, geralmente espanhol, e que trata também de realizar as rendições dos vigilantes do Parque Natural da Madeira que ficam nas ilhas para vigiar o seu património natural. Depois de um dia e meio no Funchal, e de comprados todos os mantimentos necessários, embarquei no barco patrulha N.R.P. Cuanza às 23 horas do dia 26 de Junho de 2012, tendo o navio zarpado uma hora de depois, sob uma meia lua em quarto crescente e alguma neblina.
Um mar estava calmo, quase não se sentia a ondulação a bordo, e verifiquei que os tripulantes viam os passeiros, eu e o vigilante Jaques, como mais uma peça de equipamento que tinham de transportar. Da fama de oficiais e cavalheiros, estes marinheiros pouco proveito tiravam, no dia seguinte nem comida nos ofereceram enquanto almoçavam o seu arroz de polvo. Achei melhor esforçar-me por não os incomodar e sair do caminho porque naturalmente tinham o seu oficio a desenpenhar. Fiquei a ver as luzes do Funchal desaparecer durante talvez uma hora e depois procurei um pouso onde dormir um pouco, no porão do navio. O chão podia ser de ferro e o ruído dos motores algo insurdecedor, mas nada disso me impediu de dormir um belo sono.
Acordei por volta das oito da manhã, um pouco dorido da cama de ferro, mas restabelecido e pronto para o dia que começava. Quando subi ao convés vi o mar alto a toda a volta, no horizonte nem terra nem navio, só o eterno buliço do oceano. Pensei para com os meu botões que nunca tinha estado no mar tão longe de terra, e deixei-me ficar a apreciar o espetáculo das ondas em infinitos tons de cinzento, sob o céu baixo e plumbeo. Indiferentes à nossa presença, e ao ruído dos motores, iam passando por nós aves marinhas, que no seu domínio total dos ventos conseguiam facilmente ultrapassar o navio e dar voltas em nosso redor. A maioria eram cagarras e almas-negras, mas também os calcamares, no seu jeito brincalhão de cangurus dos mares, iam saltitando sobre as águas, de onda em onda.

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