terça-feira, abril 22, 2008

A outra inevitabilidade do ser

Finalmente decidi ser "A insustentável leveza do ser", livro cujo título, como é óbvio, ajudou a inspirar o nome deste blog. Por acaso, ou na verdade porque estou na Holanda, estou a ler o livro na versão inglesa. Ora eis a escandalosa verdade, o título em português está mal traduzido!!!!
Quer dizer, como o original foi escrito no checo natal do Milan Kundera, também é possível que seja o título inglês que esteja errado, mas pelo que li do livro, a versão inglesa parece-me fazer mais sentido.
O título inglês é "The unbearable lightness of beeing". Notaram a diferença? The unbearable lightness of beeing traduz-se em português como A inevitável leveza de ser. Pode parecer pouco, mas a diferença no artigo altera radicalmente o significado da frase.
A inevitável leveza do ser reporta a um indivíduo, um ser em particular, que posso ser eu, o leitor, pode ser ele, o escritor, podemos ser todos nós, mas individualmente. Já a inevitável leveza de ser reporta à existência, ao conceito de existir, ao sentido d estar vivo, em ultima análise ao sentido da vida. É toda a existência que é insustentavelmente leve, não apenas a existência de um indivíduo particular.
Mas de uma forma ou de outra, é um excelente livro. Até agora já me ensinou uma coisa, algo que eu não sabia. A palavra latina pasio, que em português originou paixão, significa em latim sofrer. Não é uma perfeita definição de paixão? A paixão é como uma doença que se sofre, como uma droga que nos agarra, que queremos mais e mais e depois nos deixa de rastos quando nos falta. Paixão não tem nada que ver com amor, são coisas diferenças. O amor pode começar na paixão, mas continua no tempo, indefinidamente. E pelos vistos os antigos romanos percebiam isso melhor do que nós...

6 comentários:

Maçã Azul disse...

Mais uma tradução em que o tradutor deu asas a uma liberdade que não deveria ter... infelizmente não é o único caso!

O que dizer da paixão?
É maravilhosa quando é correspondida!
Mas pode ser realmente dolorosa...

Marco Fav disse...

"a insustentàvel leveza do ser", acho que jà vi um livro pt com essa tradução em vez de "inevitàvel"

Unknown disse...

A diferenca era so no "de" e no "do", se meti ali inevitavel no meio foi liberdade minha... A traducao correcta e, claro, insustentavel e e esse a que aparece nos titulos em portugues. O problema e o tal do, que devida ser um de!

Marco Fav disse...

Eu, no teu lugar, contentava-me com o seguinte facto: "se isso te preocupa, não tens problemas muito graves na tua vida" lol

caderno escuro disse...

Está muito bom este post. Parabéns. Quanto há traduçäo concordo perfeitamente contigo. Faz toda a diferença, embora podemos partir de um "eu" individualizado para a existência vaga, embora seja um pouco forçado o salto.

Sempre acreditei que a paixao faz mal, muito mal, como um estado de racionalidade limitado, ou nulo e isso, só pode fazer mal...
Parabéns.

MJ disse...

Daí a expressão cristã 'paixão de Cristo' que reflecte o seu sofrimento quando da crucificação. A palavra evoluiu em termos de significado ao longo dos séculos, passando a designar qualquer sentimento muito forte e, em última instância qualquer atracção forte ou amor.