As gotas de sangue rolaram sobre a folha de papel, lágrimas salgadas correndo sobre uma face, branca como a luz da última manhã do Inverno. A viva cor rubra das gotas perdeu a sua fogacidade, enquanto o líquido se misturou lentamente com a suave textura do papel. Estranhos padrões dispersos mesclavam agora pureza da folha em floreados de mil tons castanhos e avermelhados.
Ela olhou para o dedo. "Merda, um golpe de papel" pensou ela, enquanto olhava para o ínfimo corte no dedo indicador de onde brotava o sangue. Lambeu o dedo num gesto que poderia ser sensual, não fora o seu nítido olhar de revolta. Odiava sangue! Procurando estancar a ferida com a pressão firme do seu polegar, retomou o seu trabalho, olhando para a longa lista de nomes que se espalhava por várias dezenas de folhas, num alongado rosário de vidas que se cruzariam, apenas neste dia, naquela sala.
Ele entrou, solene como sempre achara que devia ser naqueles momentos. Dirigiu-se para a mesa, não sem alguma avidez mal contida, e entregou-lhe um pequeno rectangulo de papel, aquele que para o mundo era a prova última da sua existência. Depois da curta troca de olhares, quase que em segredo, recebeu aquela que seria a sua contra-senha, uma decisão que só ele poderia tomar. Em segredo, escondido por trás de um velho biombo empoeirado e bafiento, espalhou a sua sabedoria e pensar numa pequena cruz de tinta, dobrou a folha em quatro e foi votar.
1 comentário:
Espero que tenha votado no Garcia Pereira... estou, obviamente a brincar. Excelente post!! Abraço alienado!!
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