Na semana passada estivemos no Gerês. Um dos pontos de passagem foi a barragem de Vilarinho das Furnas, um triste exemplo de como um país abdica de tudo em troca do progresso cego, seja das suas riquezas naturais, seja do seu futuro, seja mesmo das vidas das suas gentes. A aldeia de Vilarinho das Furnas foi submersa pelas águas da barragem com o mesmo nome em 1971. Em nome do progresso, toda uma comunidade foi eliminada do mapa, vidas perdidas, memórias esquecidas, paisagens perdidas. Claro que a população da aldeia foi repovoada para outros locais, mas deixaram todas as suas vidas para trás, toda a sua história, tudo aquilo que eles eram. Vidas inteiras deitadas fora, em troca de pouco ou nada...
Vilarinho das Furnas... antigamente.
Vilarinho das Furnas... hoje.
O grande Miguel Torga registou em palavras o absurdo de um país que coloca o valor de um muro de cimento acima do valor das suas gentes:
Viam a luz nas palhas de um curral,
Criavam-se na serra a guardar gado.
À rabiça do arado,
A perseguir a sombra nas lavras,
aprendiam a ler
O alfabeto do suor honrado.
Até que se cansavam
De tudo o que sabiam,
E, gratos, recebiam
Sete palmos de paz num cemitério
E visitas e flores no dia de finados.
Mas, de repente, um muro de cimento
Interrompeu o canto
De um rio que corria
Nos ouvidos de todos.
E um Letes de silêncio represado
Cobre de esquecimento
Esse mundo sagrado
Onde a vida era um rito demorado
E a morte um segundo nascimento.
Miguel Torga
Barragem de Vilarinho das Furnas, 18 de Julho de 1976
Barragem de Vilarinho das Furnas, 18 de Julho de 1976
1 comentário:
Gostei muito do seu blog. ele tem conteúdo. Parabéns Pedro.
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