Há anos e anos que uma coisa me impressiona, a capacidade das pessoas para continuarem as suas vidas independentemente do que se passa à sua volta. Vemos isso nos locais atingidos por grandes sismos ou outras catástrofes, vemos isso nas família afectadas por grandes tragédias e até nos casos em que a mudança, em vez de física, é mais psicológica.
Vou explicar melhor. Desde sempre que senti um grande fascínio pelas grandes mudanças civilizacionais, se calhar somos todos assim, lembro de ter vibrado ao ver na TV a queda do muro de Berlim, só porque sentia que estava a ver à minha frente a História (com H grande) a ser escrita. Imaginem os grandes momentos da História. Pensamos sempre no grande plano, civilizações que caem, outras que emergem, grandes líderes, grandes ideias que se impõe, o avanço da humanidade. Mas, se pensarmos na vida comum, das pessoas comuns, quase nada muda. Por exemplo, o dia 25 de Abril de 1974 foi sem dúvida o mais importante da história de Portugal nas última décadas, pelo menos desde 1910. Muitas pessoas até andaram nas ruas, a "ouvir o vento da mudança" como dizia a música dos Scorpions, outras nem isso, mas ao fim do dia, as mães foram na mesma fazer o jantar aos filhos, as pessoas empregadas foram na mesma deitar-se cedo para irem para o emprego no dia seguinte, os padeiros fizeram a mesma massa do pão, as crianças fizeram os seus trabalhos de casa, etc. etc. A verdade é que a história pouco ou nada é notada por aqueles que a vivem. Todos vivemos na vanguarda da história da humanidade e raramente nos lembramos disso.
Uma vez li uma frase, curiosamente num livro de literatura fantástica, que resumia isto de maneira perfeita: "Todos os acontecimentos, independentemente de quão bizarros ou abaladores, diluem-se passados momentos da sua ocorrência pela continuação das rotinas necessárias do dia-a-dia." O livro chama-se The Farseer e a autora Robin Hobb.
Agora, se imaginar-mos uma grande mudança futura, sei lá, uma hecatombe como uma guerra mundial, o primeiro contacto com uma civilização extraterrestre ou a descoberta da fusão a frio. O que nos vai acontecer? Ficamos euforicos, amedrontados ou mortificados, crescem em nós sonhos, esperanças, temores ou terrores, mas, ao fim do dia, vamos continuar a ter as mesmas prioridades: comida, bebida e abrigo para nós, comida, bebida e abrigo para aqueles que amamos, só depois em segundo lugar, saúde, segurança, liberdade e justiça, e só depois nos preocuparemos com a ultima novidade da história!
Às vezes é bom por tudo em prespectiva!
3 comentários:
Há uma frase de Sartre que adoro, e da qual me lembro quase todos os dias que é (mais coisa, menos coisa) "Não importa o que fizeram de nós... o que importa é o que nós fazemos com o que fizeram de nós" Talvez pareça que não tem nada a ver com o teu post... mas tem. Aliás tem a ver com quase tudo.
Mas num comentário mais direccionado, se o meu filho tivesse nascido no dia 25 de Abril de 74, garanto-te que esse para mim seria o dia mais importante da história. Mas como nasceu a 1 de Fevereiro de muitos anos mais tarde, esta data é para mim a mais importante da história.
Lá está, o nascimento do teu filho é o momento mais importante da tua história e nada que a História te atire ao caminho alguma vez vai mudar isso.
No fundo, acho que o que eu queria dizer com este post é que todos nós sabemos, no nosso intimo o que é realmente importante para nós
Eu sei. Esta foi a minha forma de te demonstrar que percebi exactamente o que querias dizer.
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